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Sentado
no banco da praça totalmente embriagado e
cantando, ficava Mané Dez. Às vezes lia um
jornal para espanto dos jovens, e comentava
aos brados as notícias.
"O governo vai aumentar o preço da
gasolina." e dava uma explicação convincente
para a manchete. Ficávamos mais espantados
ainda.
Como aquele bêbado podia entender daquilo?
Quando o víamos gritávamos:
Mané!!! canta!
E êle arrematava:
"Parei meu carro na Praça Paris
Eu a Conceição
Aderrepente recebi um bá noite
Era du Cosme Damião..."
Mané!!! canta "A Jardineira"
e lá ia ele:
"O jardineira porque istás tão tristes
mais ú que foi qui aconteceu
foi a camélia que deu dois suspiros
que caiu do galho e depois morreu
É vem a jardineira..."
Ele sempre trocava a estrofe...
No final pedia uns trocados para tomar mais
umas.
Volta e meia, na estrada, lá estava o Mané
esborrachado. O socorro era imediato.
"O que houve Mané?"
"A bicicreta caiu respondia ele".
Ora, com aquele quantidade de álcool no
corpo ele devia ver duas ou mais estradas.
Como bicicletas não andam sozinhas, nem
bêbadas ficam, a teoria do Mané era fruto do
destilado de cana.
Pode parecer piada mas o fato aconteceu.
Mané tinha um amigo, o Bôca de Ouro. Bebiam
todas. Numa dessas farras os dois foram para
um lugarejo próximo de Piraí e ficaram até
de madrugada. Na volta tinham que passar
pela rodovia Presidente Dutra.
Pegaram as bicicletas e na contramão pelo
acostamento iniciaram a grande descida
próxima ao Arrozal. Escuro, estrada com
pouco movimento, lá vão eles descida abaixo.
De repente Bôca de Ouro diz para Mané:
"É vem duas motas subindo! (estavam na
contramão, ou seja os caminhões subindo).
Vou passá no meio delas!"
Como Mané estava no torpor de Baco e açodado
por Morfeu, não disse nada.
Bôca de Ouro entrou na pista e deu de cara
com um caminhão Scannia carregado subindo
muito lentamente. Sorte sua, pois a pancada
foi menos violenta. A bicicleta e o condutor
foram parar longe.
Com a batida os caminhões pararam e
socorreram os discípulos de Baco. Bôca de
Ouro foi levado para o Hospital de Piraí.
Nossa família foi chamada (eram nossos
empregados), e meu irmão o transferiu para o
Rio de Janeiro para o Souza Aguiar.
Traumatismos múltiplos que ele não sentiu de
tão anestesiado.
Fui até lá, e encontro uma semana depois,
Bôca de Ouro deitado na enfermaria todo
estropiado e rindo muito. Falei com êle: Que
maluquice! podia ter morrido!
"...tava de porre e pensei que era duas
motas (motocicletas)".
Se recuperou e voltou ao trabalho. Seus
amigos de copo e farra, cairam em sua pele
com o acontecido.
Não os vi mais. Já se passaram muitos anos,
mas é provável que suas almas dedicadas ao
arrasta-pés e a boa pinga do interior, ainda
frequentem os botecos e festas na região.
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