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Em dez de junho de 1857, o comendador
Joaquim José de Sousa Breves, um dos
maiores senhores e traficantes de escravos
do Império, um dos vários personagens de
nosso recente estudo Bumerangue
encapsulado, escreveu um ofício ao então
presidente da província do Rio de Janeiro,
João Manuel Pereira da Silva. Breves
estava muito preocupado com o “indício de
sedição entre seus escravos, no município
de São João do Príncipe”.
Seu incômodo
era devido, num primeiro momento, ao fato
de ter encontrado mais de 34
latas de pólvora na senzala de um de suas
fazendas. Isso daria para carregar muita
munição, e provocar explosões de grandes
proporções onde os escravos bem
entendessem. Para sua surpresa, descobriu
que a grande quantidade de pólvora servia
para fins menos sediciosos.
Os escravos de suas e das demais
fazendas da região “andavam se reunindo de
noite, há seis meses, em grupos ocultos”,
numa sociedade chamada Dom Miguel.
Cada
“iniciado”, segundo as investigações do
próprio comendador Breves, “era queimado e
bebia pólvora com misteriosas misturas”.
Apesar dos castigos que Breves mandou
aplicar nos escravos que descobriu
pertencerem à tal “seita”, “eles
continuavam com estas baboseiras”.
Breves desconfiava que em tais reuniões
poderiam ser combinados planos para uma
grande insurreição, dada a “insistência
dos escravos em continuar se encontrando,
por várias noites seguidas”. Descobriu que
os “iniciados” deveriam pagar uma certa
quantia de dinheiro para os “mestres da
seita”, o que lhe despertava a
desconfiança da estratégia para ganhar
dinheiro “inventada por certos negros
espertalhões”.
Como as autoridades locais não faziam
qualquer tipo de investigação mais
profunda
sobre as atividades da “seita Dom Miguel,
nem mesmo dela tomavam se quer
conhecimento”, Breves – com toda a
autoridade de um dos membros mais
prestigiados da
elite senhorial – escreveu diretamente ao
presidente da província do Rio de Janeiro.
Aproveitando a situação, pediu ao mesmo a
mudança de todas as autoridades da Justiça
naquela região.
Em sua opinião, “o delegado e o
subdelegado eram doidos, além deste último
ser bobo e vingativo”. Isso porque,
avaliava Breves, tais autoridades, ao
invés de pedirem reforço policial à Corte
para evitar uma possível insurreição dos
escravos, se dedicavam a se “vingarem de
questões pessoais, e resolverem
intriguinhas”.
João da Silva atendeu de pronto à
denúncia de Breves, mandando o chefe de
polícia
interino da província do Rio de Janeiro,
José Caetano de Andrade Pinto, começar as
investigações sobre a “seita Dom Miguel”.
Além disso, nomeou um novo subdelegado,
Eusébio da Fonseca Guimarães, que passou
imediatamente a dar buscas nas senzalas
para
encontrar objetos roubados que pudessem
dar algum indício sobre o plano dos
escravos
matarem os senhores da região. Eusébio
proibiu que os escravos saíssem à noite
das fazendas de seus senhores, para que as
“reuniões sinistras fossem interrompidas”.
Em suas primeiras buscas, encontrou
“raízes e ervas venenosas, que podem
produzir graves incômodos de saúde”. Os
“pretos encontrados com estes objetos
foram castigados, evitando o mal maior”.
Tais notícias foram comunicadas a João da
Silva, em “carta confidencial” de 21 de
junho de 1857, pelo próprio Eusébio, que
ainda informou “não haver indício algum de
sedição entre os escravos”.
Mas os trabalhadores livres e moradores
dos núcleos urbanos próximos àquelas
fazendas não estavam bem certos quanto à
improvável insurreição. Os boatos eram
tantos
que os administradores das fazendas
recorreram ao novo subdelegado, alegando
que era
necessário pedir, “o quanto antes,
reforços para evitar as sedições dos
escravos”. Diante de tal situação, Eusébio
passou a dar buscas também nas roças, onde
poderia encontrar mais objetos e raízes
escondidas pelos escravos, que já sabiam
de suas idas às senzalas, bem como dos
castigos que sofreriam caso seus “feitiços
fossem encontrados”. Tratou de isolar “os
escravos do fazendeiro Joaquim Breves, que
não têm contato com os dos fazendeiros
vizinhos, e por isso é impossível que
possam entre si estabelecer um acordo para
qualquer fim sinistro”.
Eusébio havia “percebido que entre
aqueles escravos havia nações rivais,
apesar da
harmonia forçada em que vivem pela
sujeição do cativeiro”. Mas, havia uma
coisa que unia tais escravos, “a
supersticiosa idéia que sempre domina a
raça africana,
acreditando em seus fetiches, patuás,
amuletos etc., quando praticam cerimônias
e danças grotescas do seu país, e nesta
prática supõem alcançarem absurdas
felicidades, regresso à sua pátria, a bem
de algumas doçuras ao cativeiro em que
vivem, e mil insignificantes
coisas de sua fantasia”.
O subdelegado também tinha uma idéia de
“África fetiche”, segundo nossa
interpretação, supondo que aqueles
escravos estavam externando aquilo que
seria afeito à sua “raça africana”. Assim,
o comportamento dos mesmos seria dominado
pela irracionalidade. De todo modo, o
subdelegado alegara que, apesar dos
escravos terem motivos de sobra para
“manifestar a rivalidade entre suas
diferentes nações”, a crença no feitiço
era superior à tais querelas.
As coisas pareciam se agravar em São
João Marcos. Em “correspondência
confidencial”, de nove de julho, o
delegado local, Antonio Cesar de Azevedo,
escrevia ao vice-presidente da província
do Rio de Janeiro comunicando que havia
confirmado a informação de que os escravos
de diversas fazendas realmente andavam
planejando uma insurreição.
O centro das reuniões dos escravos era,
segundo o delegado, a “lavoura da fazenda
São Joaquim, pertencente ao comendador
Joaquim Breves, onde guardam zagaias e
outros instrumentos de semelhante gênero”.
O vice-presidente resolveu também
investigar
o caso. Leu cartas de empregados e
caixeiros de fazendas da região, datadas
de dez e 11 de junho, nas quais tomou
conhecimento da existência de 270 colonos
portugueses numas das fazendas de Breves
que poderiam ser atingidos com a
insurreição. Era necessário
esclarecer, ainda segundo o
vice-presidente, quais eram os fins da
“associação de Dom
Miguel, de que trata a carta do comendador
Breves”.
No dia 22 de julho, novamente chegavam
notícias sobre o fracasso do plano de
insurreição, após as batidas das
autoridades policiais nas senzalas dos
escravos, bem como os castigos aplicados
aos “escravos feiticeiros de Dom Miguel”.
No dia 24 de julho, num “ofício reservado”
dirigido ao Palácio da Presidência da
Província do Rio de Janeiro,
chegou ao ministro e secretário dos
Negócios da Justiça, Francisco Diogo
Pereira de
Vasconcelos, a confirmação de tais
notícias são confirmadas. Aparentemente, a
“associação de feitiçaria Dom Miguel”
havia sido dissipada por senhores e
autoridades imperiais tendo à frente o
comendador Breves. Não se falava mais em
“insurreição” nem em “feitiçaria” entre os
inúmeros escravos das fazendas daquele
lugar.
Entretanto, a tranqüilidade que as boas
novas traziam deu lugar à mais apreensões
por parte de altas autoridades imperiais.
Os escravos de São João Marcos
“acreditavam que o dia de Santo Antonio
seria o fim do mundo”. O ministro conta
que se “ouvia nas ruas da Corte semelhante
boato entre os escravos”, boato este
que ia se “espalhando rapidamente por toda
a província do Rio de Janeiro”.
Neste sentido, recomendava o ministro
aos chefes de polícia que “todas as
investigações e práticas necessárias
fossem tomadas para tão importante
objeto”.
COUCEIRO, Luiz Alberto Alves. "PAI
GAVIÃO E A COROA DA SALVAÇÃO: CRENÇA E
ACUSAÇÕES DE FEITIÇARIA NO IMPÉRIO DO
BRASIL". Dissertação de Mestrado
apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Sociologia e
Antropologia – PPGSA, Instituto de
Filosofia e Ciências Sociais da
Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Mestre em Sociologia (com concentração
em Antropologia). |
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São
Miguel Arcanjo, cujo nome significa "o
que é um com Deus", é considerado o
chefe dos exércitos celestiais e o
padroeiro da Igreja Católica
Universal. É o anjo do arrependimento
e da justiça.
Ao final dos tempos
aparecerá Miguel, o grande Príncipe
que defende os filhos do povo de Deus.
E então os mortos ressuscitarão. Os
que fizeram o bem, para a Vida Eterna,
e os que fizeram o mal, para o horror
eterno".
"Houve uma grande
batalha no céu. Miguel e seus anjos
lutaram contra Satanás e suas legiões,
que foram derrotadas, e não houve
lugar para eles no céu. Foi
precipitada a antiga serpente, o
diabo, o sedutor do mundo. Ai da terra
e do mar, porque o demônio desceu a
vós com grande ira, sabendo que lhe
resta pouco tempo".
"O Arcanjo
Miguel, quando enfrentou o diabo,
disse: "Que o Senhor o condene". Por
isso São Miguel é mostrado atacando o
dragão infernal.
Oração publicada pelo papa Leão XIII.
“São Miguel Arcanjo defendei-nos no
combate, sede nosso refúgio contra a
maldade e as ciladas do demônio!
Ordene-lhe Deus,
instantemente o pedimos; e vós
príncipe da milícia celeste, pelo
poder divino, precipitai no inferno a
satanás e a todos os espíritos
malignos que andam pelo mundo para
perder as almas. Amém.”
A 7ª Linha -
Linha das Almas dirigida por Dom
Miguel, que no sincretismo católico
corresponde ao Arcanjo São Miguel,
integrada por Omulu (Obaluayê)
# Legião de Pai Cambinda, integrado
pelas Falanges do Povo da Costa
# Legião de Pai José D'Angola,
integrado pelas Falanges do Povo
D'Angola
# Legião de Pai Congo (ou Rei Congo),
integrada pelas Falanges do Povo do
Congo
# Legião de Pai Jerônimo, integrada
pelas Falanges do Povo da Moçambique
# Legião de Pai Francisco, integrada
pelas Falanges do Povo da Loanda
# Legião de Pai Benguela, integrada
pelas Falanges do Povo de Benguela
# Legião de Pai Guiné, integrada pelas
Falanges do Povo de Guiné |
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