A doação aos pescadores de Angra

Retornar

 
     
 

No dia oito de julho de 1870, terça-feira, o comendador José Joaquim de Souza Breves, conhecido por José Breves, escreveu em seu testamento:

"Declaro que sou filho do Capitão-mór José de Souza Breves e de Dona Maria Pimenta de Almeida, nascido e batizado nesta freguezia do Pirahy e morador do Arrozal..."

Após sua morte em 1879, começou um longo processo de distribuição de terras, dinheiro, ilhas, imóveis e outros pertencentes, que atestavam a fortuna do irmão do "rei do café" - comendador Joaquim Breves.

Ascendino Dantas, escritor de São João Marcos relata sua saga:

"Foi proprietário da decantada Fazenda do Pinheiro, no município de São João Baptista do Arrozal, além de inúmeras outras propriedades e vários milheiros de escravos. Suas propriedades territoriais estendiam-se até Mangaratiba e Angra dos Reis, e dentro delas, achava-se a célebre Ilha Francisca, fronteiriça à Angra dos Reis.

Não tiveram descendentes, tendo o velho Comendador falecido depois de sua mulher, deixando belíssimo testamento do qual se depreende seu espírito altamente filantrópico, mas que infelizmente jamais foi cumprido no todo. Não só deixava forros todos os seu numerosos escravos, como ainda lhes deixava terras onde vivessem, e de cujo maneio poderiam tirar farto sustento para si e seus descendentes."

O legado de José Breves, infelizmente até hoje não foi executado. As terras se perderam na mão de inescrupulosos, títulos foram queimados, e seus agregados, parentes e escravos perderam tudo.

 
 

Inventário do comendador José de Souza Breves. "A saga dos Breves". Pe. Reynato Breves.
 

 
  A edição da Revista Veja, no. 2124 de 5 de agosto de 2009, mostra o destino de uma dessas ilhas deixadas para ex-escravos com cláusula  de usufruto até a 3a. geração. O título da matéria é - "Ambiente - FAXINA NAS ILHAS DE ANGRA"

O mais badalado balneário do Brasil é alvo de uma mega operação ambiental. Mais de 150 processos de licenciamento estão sendo revistos – e as multas são salgadas como o mar.

 
Marcelo Bortoloti. Fotos Oscar Cabral e Raul Junior. Divulgação. MAQUIAGEM NATURAL. Do barco, a mata da Ilha da Cavala parece exuberante; do helicóptero, porém, o cenário é de devastação.
 

"Vista do mar, a Ilha da Cavala, na baía de Angra dos Reis, no litoral fluminense, parece um pedaço intocado de Mata Atlântica. Mas há um ano, sobrevoando a região de helicóptero, fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) descobriram que, em seu miolo, a floresta dera lugar a uma mansão de 1 800 metros quadrados. Ela pertence ao empresário Antônio Cláudio Brandão, um dos sócios da rede Localiza, e foi construída sem licença ambiental. Multado em 1 milhão de reais, Brandão recorreu, mas a obra, praticamente concluída, está embargada. Outras duas multas, no valor total de 850.000 reais, couberam ao empresário paulista Rolf Baumgart, dono do Shopping Center Norte e da indústria química Vedacit. Ele foi autuado por construir uma casa sobre um costão rochoso, com píer e heliponto, na Ilha das Palmeiras. O Ibama determinou a paralisação da obra, mas não foi atendido. A Polícia Federal, então, prendeu os pedreiros (pois é, sobrou para os coitados) e apreendeu um minitrator e três barcos que transportavam material de construção. Esses são apenas os dois casos mais ruidosos de devastação promovida por gente graúda em Angra dos Reis, cujas ilhas chegam a ser negociadas por até 18 milhões de reais. Desde 2007, o Ibama aplicou dezessete autos de infração a proprietários de mansões da região. O Ministério Público abriu catorze processos para demolição e a prefeitura de Angra dos Reis diz ter outros setenta em andamento. Para completar, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), criado neste ano para cuidar das licenças ambientais no Rio de Janeiro, está revendo 164 processos de licenciamento.
Fotos Oscar Cabral e Raul Junior

A baía de Angra dos Reis abriga em suas águas verde-esmeralda 365 ilhas, das quais 150 são habitáveis. Na década de 70, embora o lugar já atraísse famosos, como o cirurgião plástico Ivo Pitanguy, havia apenas uma aldeia de pescadores debruçada sobre o mar. Com a inauguração da Estrada Rio-Santos, a ocupação desse paraíso explodiu – e, agora, a investida dos órgãos de fiscalização e controle ambiental revelou um emaranhado legal. No início, como as ilhas são patrimônio da União, comprava-se o direito de posse adquirido pelos pescadores e construía-se nelas o que se quisesse. Não havia legislação específica a respeito. Embora o Código Florestal, de 1965, a Política Nacional do Meio Ambiente, de 1981, e o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, de 1988, já falassem na preservação da área, os órgãos ambientais entendiam – ou fingiam entender – que a restrição se referia apenas à ocupação industrial. Em 1994, finalmente, o governo estadual regulamentou uma lei que transformava as ilhas em Área de Proteção Ambiental. Ela identificava locais onde não se podia mais construir e proibia a ampliação das casas já existentes em mais de 50% do tamanho da construção original.

Tudo bonito no papel. Na realidade, a oportuna falta de funcionários que deveriam fazer a lei ser cumprida, somada à corrupção endêmica dos poucos fiscais existentes, permitiu que muitos ricaços continuassem a desmatar. O cerco apertou há apenas três anos. Em 2006, 25 funcionários do Ibama foram presos pela Polícia Federal por fraude na fiscalização. Em 2007, mais dezenove pessoas foram presas, incluindo funcionários da prefeitura de Angra dos Reis e do governo estadual, envolvidos num esquema de venda de licenças. Enquanto vários proprietários ainda insistem em burlar a lei, outros tentam regularizar situações não raro herdadas dos antigos donos. Certos casos exigirão bom senso por parte das autoridades.

"Se o problema é somente a falta da licença ambiental, fica mais fácil resolver. Mas há casas já construídas que não podem ser licenciadas, seja porque foram feitas em locais que passaram a ser proibidos, seja porque têm dimensões não mais sancionadas pela lei. Estamos estudando que solução dar a essas situações", diz Júlio Avelar, superintendente do Inea na região. O apresentador da Rede Globo Luciano Huck foi acionado pelo fato de sua mansão, na Ilha das Palmeiras, ter sido erguida sobre o espelho-d’água e as rochas, o que é proibido. Huck recorreu à Justiça e ganhou, com a justificativa de que a casa original fora construída em 1971, antes da entrada em vigor da legislação atual, e ele apenas a reformara. Ele enfrenta, contudo, outro processo: foi acusado de executar uma dragagem para construção de praia artificial sem licença para tanto. "Não estou preocupado. Mas acho importante que o poder público deixe as regras mais claras", diz Huck. Seria mesmo ótimo que tudo, além da água do mar, fosse cristalino em Angra dos Reis".

Outras ilhas que pertenceram ao potentado do café em Angra dos Reis.
 
lha Comprida - na parte norte da Baía da Ribeira, tem sua maior dimensão, 4,5 km, no sentido sudeste-nordeste. Encontra-se ligada ao continente pelos mangues da Baixada de Bracuhy. A vegetação predominante é densa e de porte alto, mas já são visíveis grandes áreas de encostas, na parte nordeste da ilha, cobertas apenas por gramíneas. Possui poucas praias, todas de pequena extensão, quase todas de propriedade particular, vistas somente na maré baixa, estão na parte norte da ilha e na Enseada de Ariró. Os costões, ao sul da ilha, são bastantes propícios para a pesca e mergulho. Na Enseada de Ariró, as áreas de manguezais favorecem a pesca de siris e caranguejos, durante a noite, e de ameijoas, durante o dia. A 15 minutos do centro a partir do Cais de Santa Luzia.
Ilha Francisca - também chamada de Poranga ou Bonita, em tupi-guarani, está localizada em frente à cidade de Angra. Já pertenceu a Francisca Vigília Fogaça, neta de Martin Afonso de Souza. Em 1911 foi doada pelos deputados de Angra ao então Presidente da República Hermes da Fonseca. É uma bela ilha, bem próxima ao centro da cidade. O melhor ponto para avistá-la do continente é na Estrada do Contorno, na altura da costeirinha. Hoje é propriedade do Hotel Londres. A 10 minutos do Cais de Angra dos Reis.
Em outro trecho de seu testamento, José Breves faz uma doação à Santa Casa de Angra dos Reis e dispõe sobre o Porto de Jurumirim. Hoje, a ilha de Jurumirim pertence ao navegador Almir Klink.
 
 

 
 

 
  Passados 130 anos, resta em Angra dos Reis, cenários de destruição, construções irregulares nos morros, tragédias sucessivas, que são fruto do descaso com a Natureza e meio ambiente.

Talvez, se as cláusulas testamentárias fossem respeitadas, e as respectivas doações do comendador José Breves confirmadas, Angra dos Reis e arredores não seriam objeto de tamanha especulação, de explosão desenfreada de habitações, de falta de zelo para com a coisa pública.

 
 

© 1996/2010 — Todos os direitos reservados: Aloysio Clemente M. I. de J. Breves Beiler
História do Café no Brasil Imperial -
http://www.brevescafe.xpg.com.br - Rio de Janeiro, RJ.