José Cândido de Freitas Albuquerque

Médico cirurgião da Armada Brasileira, Heroi e Mártir da Guerra do Paraguai.

Luiz Castro de Souza traça um pungente retrato da vida  do médico e oficial da Armada na Guerra do Paraguai, José Cândido de Freitas Albuquerque, na Revista Marítima Brasileira, por ocasião do aniversário da fundação do Instituto Brasileiro de História da Medicina, em 1961. Os textos abaixo são exertos da brilhante narrativa citada.

"No ano de 1835, nasce da Bahia, JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE, filho do casal Conselheiro
Francisco de Freitas Albuquerque e Dona Constância Clara de Freitas Albuquerque. Matricula-se na Faculdade de Medicina da Bahia - primaz do Brasil - e sai com o grau de doutor em medicina, no ano de 1857, após defender tese, intitulada: "Existe uma base certa para o diagnóstico das afecções orgânicas do coração em geral?"

Faculdade de Medicina de Salvador, Bahia.

Ainda acadêmico, em 1855 assistiu à terrível epidemia de cólera morbus que fez ceifar milhares de vidas naquela Província e viu parentes, amigos e companheiros tombarem diante dêsse cruel flagelo, até então, desconhecido nas  plagas brasileiras.

Entre os estudantes que se oferecem ao Govêrno para a cruzada contra a epidemia e a morte, acha-se presente o acadêmico de medicina JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE. Alguns de seus colegas de Faculdade, como Joaquim de Magalhães Menezes, Alcebiades Firmo Botelho, Américo Silvestre de Farias e Elpídio Canuto da Costa, foram impiedosamente dizimados pela peste e tombaram como heróis autênticos e companheiros legítimos do Doutor Cipriano Barbosa Batâmio — mártir da medicina
brasileira — sucumbido na cidade de Santo Amaro, na Bahia, defendendo a saúde de seu povo e de sua gente.
 

A ação do estudante de medicina JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE contra a epidemia, fez-se sentir não só na Bahia, mas, também, na Província das Alagoas, sendo seus serviços elogiados pelo Govêrno, conforme afirma Sacramento Blak que foi, também, um dos médicos militares designados para socorrer os pestosos.


Após sair diplomado pela veneranda instituição do largo do Terreiro de Jesus, ingressa o Doutor JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE no Corpo de Saúde da Armada Imperial Brasileira, e o faz com entusiasmo de moço e resolução de usar o botão de âncora para grandeza da medicina naval brasileira. Vai servir na flotilha do Amazonas, quando é designado em Belém do Pará para a enfermaria
de marinha do Arsenal, lugar em que permanece de outubro de 1858 a abril de 1861.

A Guerra do Paraguai

O General Solano López, tirano do Paraguai, manda  invadir a Província de Mato Grosso, segundo suas
instruções firmadas em Assunção a 13 de dezembro de 1864, por duas expedições, uma fluvial e outra terrestre, constituídas de mais de 5.000 guerreiros, cinco navios de guerra, três  escunas e duas chatas canhoneiras, totalizando 54 peças de  artilharia... atacaram o Forte de Coimbra nos dia 27 de dezembro.

Duque de Caxias Dom Pedro II General Solano López

Forte colonial erguido pela Engenharia Militar portuguesa em 1775, e que teve parte ativa em diversos momentos, na defesa da raia lindeira no rio Paraguai. Foi construído para defender o território brasileiro contra invasões espanholas e foi palco para batalhas na Guerra do Paraguai quando de acordo com lendas o milagre de Nossa Senhora do Carmo reverenciada pelo exército brasileiro, evitou que o local fosse dominado por forças inimigas. Localizado no município de Corumbá, Mato Grosso do Sul.
Diante daquela numerosa formação guerreira e a escassez de munições e víveres no Forte, o comandante Porto Carrero reúne um conselho de oficiais que delibera o abandono da praça, o que se realiza na noite escura de 28 para 29, com o auxílio da canhoneira brasileira Anhambaí — único navio da flotilha, armado com duas peças de calibre 32 e tripulado por 34 homens que havia s postado no meia do canal, acima do Forte, e vomitava fôgo continuadamente contra o inimigo. Êsse vaporzinho estava sob o comando do 1.° Tenente Balduino de Aguiar e tinha como médico o 2.° Cirurgião, 2.° Tenente, DOUTOR JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE que acolheu aqueles punhados de heróis constituídos pelo comandante, oficiais, praças, mulheres e crianças que levavam a  imagem de Nossa Senhora do Carmo — Padroeira do Forte — transportando-os para Corumbá.

Vapor, canhoneira Anhambay. Afundado no rio Yaghuy durante a Guerra do Paraguai (1864-70). Recuperado e em exposição no Parque nacional Vapor Cué. Fabricado pelo Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, Marinha Imperial Brasileira (1858)

É uma retirada desolante, desordenada, trágica. As embarcações particulares e de todo o tipo são invadidas pela população dominada pelo mêdo.  A travessia dura quatro meses, percorrendo 650 quilômetros ...

"Na foz do São Lourenço, a 6 de janeiro de 1865 o Anhambaí é avístado pelos dois navios de guerra paraguaios.
Imediatamente perseguido rio acima pelo inimigo, tomando a dianteira o Iporá, o vapor brasileiro faz
vivo fôgo sôbre o mesmo, apesar de seguir em retirada que se estendeu por seis léguas. O navio brasileiro se encontrava com apenas um rodízio de 32 que no décimo-terceiro tiro desmontou-se,
conforme diz, em sua parte, o Capitão de Fragata Castro Menezes.
Nêsse último disparo foi matar o 2.° Tenente de Marinha Gregório Benítez, do Iporá. Em uma das voltas mais estreitas do rio, foi o Anhambaí sôbre a barranca, perto do morro do Caracará, quando é abordado pelo Iporá que mais de perto o seguia. Após uma resistência gloriosa e diante  da demasiada superioridade do inimigo, alguns marinheiros saltam em terra e salvam-se, outros, entretanto, permanecem no navio, lutando contra o invasor. Em seus postos de honra, pelejando bravamente, estavam o comandante, Piloto José Israel Alves Guimarães, o comissário Fiúza e o 2.° Cirurgião DOUTOR  JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE que foram heróis da resistência. Ao médico militar os selvagens, depois de o fazer prisioneiro, degolam-no, mutilam-lhe, cortando as orelhas para remetê-las ao seu comandante, pois, como  diz Sacramento Blake, era assim que procediam os paraguaios com seus prisioneiros- de guerra.

Batalha de Avaí, 11 de dezembro de 1868 - Quadro de Pedro Américo, Museu Nacional de Belas Artes

Deixa o DOUTOR  FREITAS ALBUQUERQUE uma filhinha de nome Constância Maria de Freitas Albuquerque, cuja pensão de quarenta e dois mil reis, anuais, manda pagar o Governo Imperial em Decreto de 15 de janeiro de 1870, pelo sacrifício de um brasileiro...
O Doutor JOSÉ CÂNDIDO DE FREITAS ALBUQUERQUE morre aos 30 anos de idade e jamais temeu o perigo, pois vi- mo-lo enfrentando a peste da cólera com resolução e altivez; defender a farda que vestia, quando alguém tentava desonra-la; enfrentar os poderosos do mando, quando sua dignida- de era atingida, sem pensar nas conseqüências; publicar sua defesa sem anuência do seu superior, porque assim ditava sua consciência de homem de bem e de médico, e, desse modo, outro não poderia ser o seu trágico fim, apanágio de toda sua vida: bravura diante do perigo, ainda mais se tratando  de um algoz do seu país. Morreu no posto de honra,  defendendo com armas nas mãos o seu navio Anhambaí, quando sua missão sagrada era preservar a saúde e a vida das criaturas confiadas a seus
cuidados.
O 2.o Cirurgião DOUTOR FREITAS ALBUQUERQUE foi um autêntico herói da Armada e da Medicina Militar Brasileira, e primeiro mártir, médico, da Guerra do  Paraguai.

O 2o. cirurgião da Armada, Dr. José Candido de Freitas Albuquerque acusado injustamente de insubordinação na canhoneira Ibicuhy, foi absolvido pelo Conselho de Guerra.
O Diário do Rio de Janeiro, sexta feira, 17 de fevereiro de 1865, publicou em Annuncios, o pedido de Monsenhor Felix de Freitas e Albuquerque, irmão do oficial da Armada José Candido de Freitas e Albuquerque barbaramente assassinado na Guerra do Paraguai,para os amigos comparecerem ao ato liturgico em sufragio de sua alma.
   
 

Fontes:

LUIZ DE CASTRO SOUZA - Membro Titular do Instituto Brasileiro e da Academia Pan-Americana de História da Medicina; da Federação das Academias de Letras do Brasil, etc.

(*) Palestra lida no dia 25r de novembro de 1961, na  Rádio Roquete Pinto do Rio de Janeiro, GB., na Segunda Semana Brasileira de História da Medicina, comemorativa do XVI aniversário de fundação do Instituto Brasileiro de História da
Medicina. 104 ,MA BRASILEIRA

Diário do Rio de Janeiro, sexta feira, 17 de fevereiro de 1865.

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