Curiosidades, Mitos, Lendas e Realidade nas terras dos Breves

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  O rapto da condessinha - Um drama familiar do Império  
   
   
  Em 18 de julho de 1857 casava-se em São Cristóvão, Rio de Janeiro, Ritta Maria de Souza Breves com o Conde Alessandro Fé d’Ostiani, encarregado de negócios do reino da Sardenha na Corte do Rio de Janeiro. Ela, filha do "rei do café", o poderoso comendador Joaquim José de Souza Breves e Dona Maria Isabel de Moraes Breves. Rita era sobrinha e neta dos barões do Piraí, porque a baronesa Cecília Breves era irmã de seu pai. Residiram na Itália e nasceu sua única filha: Paulina. Com o agravamento da saúde de Ritta, ela permaneceu na serra fluminense e os avós impediram que o Conde levasse a filha para viver com ele na Itália. Desse imbróglio familiar com consequências diplomática, o conde recorreu ao governo imperial e somente aos dezoito anos a filha foi viver em sua companhia.

Abaixo, duas matérias recentes que registradas pela revista Piauí (Caso Goldman) e um estudo de caso sobre Herança, tutela e questões diplomáticas no Segundo Reinado.

   
 

Conde Alessandro Fé d'Ostiani Ritta Maria de Souza Breves
Coleção Aloysio Clemente Breves Coleção Aloysio Clemente Breves
   

Palazzo Fé d'Ostiani, Brescia, Italia

Fazenda Santo Antônio da Olaria, São João Marcos, RJ.

Condessa Maria Paulina de Souza Breves de Fé d'Ostiani e Montholon Sèmonville. Foto: A Saga dos Breves. Pe. Reynato Breves  
   
  Mais de dois séculos atrás, um pai italiano de linhagem bem mais nobre do que o americano Goldman passou por provação semelhante. Ele se chamava Alessandro Fé d’Ostiani, era conde e diplomata de carreira. Casara-se com Rita de Souza Breves, uma das filhas do comendador Breves, considerado o brasileiro mais rico de seu tempo, e cujas terras se estendiam de Itaguaí a Parati, da serra até o mar. Tiveram uma filha, Paulina, que ficou órfã de mãe aos 6 anos de idade, permanecendo sob os cuidados dos avós.

Ao ser transferido de volta para a Itália, o conde foi proibido pela família Breves de levar a filha com ele. Precisou apelar para o imperador dom Pedro II e contou com uma escolta comandada pelo capitão Piragibe para fazer valer o mandado de busca e apreensão da filha. Tudo em vão. Piragibe e seus soldados foram escorraçados pelos homens armados da fazenda, e Fé d’Ostiani teve de partir sozinho. O comendador mandara avisar que era a última vez que o conde saía vivo de suas terras. Paulina só se reuniu com o pai quando mocinha.

Revista Piauí. Novembro 2008

Questões familiares. A Busca do filho
Dorrit Harazim. <http://www.revistapiaui.com.br/edicao_26>
Em cortes dos Estados Unidos e do Brasil, a disputa por um garoto cuja mãe morreu.
   
   
   
  O segundo caso que elegemos para relatar diz respeito a tutela de uma menina, filha de uma brasileira com um diplomata italiano. Como dissemos, o caso complexo de disputa pela tutela de uma criança, entre seu avô, um rico proprietário no Rio de Janeiro e o pai, que, pelo próprio cargo que ocupava, implicava alguma rede de sociabilidade política influente da diplomacia européia na corte do Rio de Janeiro. Os dados sobre o contendor brasileiro, Joaquim José de Souza Breves (1804-1889), nesta disputa pela tutela indicam que ele foi longevo, tendo morrido em 1889, um ano após a abolição da escravidão no Brasil. Era conhecido como o “rei do café”, tendo sido o maior proprietário de escravos e terras do século XIX. Acumulara fortuna somando a compra de fazendas à herança dos pais e ao casamento com sua sobrinha Maria Isabel de Moraes Breves, filha do barão do Piraí. Defensor de posições políticas escravistas continuou comprando escravos após a proibição do tráfico, em 1850. Suas pelejas nos tribunais foram muitas e a disputa pela tutela da neta foi apenas mais uma. Anteriormente ao episódio que estamos narrando, Breves fora julgado e inocentado, em 1852, pelo desembarque ilegal de escravos no famoso processo chamado “caso Bracuí”. Cercava-se de bons advogados, tanto que conseguiu inocentar-se de acusações de atos que praticara que eram conhecidos publicamente. Foi presidente da Câmara de São João do Príncipe, eleito e reeleito juiz de paz e vereador, deputado e duas legislaturas na Câmara Provincial. A demanda pela tutela de neta de sete anos foi encaminhada pelo advogado do avô da criança. Joaquim José de Souza Breves, por sua vez, lança mão de vários dispositivos na disputa pela tutela da neta; entre eles os pareceres de dois advogados italianos, nacionalidade de origem do pai da menina, especialmente encomendados para analisar o caso. O parecer de jurista italiano, Luiz Sauminiatelli é o mais longo e substantivamente argumentado; foi traduzido por um tradutor público, Carlos João Hunchardt. O parecer de J. Andrencci seguiu os mesmo argumentos de Luiz Sauminiatelli. Foram emitidos em 1866. A apresentação dos fatos no parecer emitido pelo advogado italiano contém toda a delicada situação de desvantagem (jurídica, por suposto) de Breves, face ao princípio da extraterritorialidade das representações diplomáticas, princípio este defendido a aceito pela maioria dos países que participaram do Congresso de Viena. Neste princípio de extraterritorialidade, a nacionalidade dos filhos de diplomatas era definida pela nacionalidade dos pais, prioritariamente. A escolha de outra nacionalidade (do território onde o filho(a) do diplomata nasceu seria de sua livre escolha, após a maioridade civil. Portanto, a neta de Breves, filha de um diplomata italiano, possuía, primeiramente, na nacionalidade italiana. Esta a razão da consulta a advogados italianos, uma vez que a disputa pela tutela de sua neta, deveria ser litigada na Itália. Na abertura do parecer, ficamos sabendo que o diplomata italiano casara-se cm uma rica senhora, em país estrangeiro e residira permanentemente na casa do pai e da mãe da esposa. Alguns anos depois do casamento, a esposa enlouqueceu, tendo morrido no estado de loucura. Atente-se para o fato já bastante pontuado na historiografia sobre as questões referidas às relações de gênero, família e ou mesmo loucura acerca da imputação de loucura às mulheres como expediente dos maridos para a separação nos casos de casamentos mal sucedidos; uma vez que o casamento, assentado como sacramento no direito civil eclesiástico, era indissolúvel.

Portanto, do casamento infeliz da filha de Breves, ficou uma neta, que sempre havia morado com os avós maternos e no parecer jurídico em tela, sustentou as qualidades e possibilidades de um futuro tranqüilo e opulento para a criança. Ademais, seus avós foram qualificados como pessoas da mais alta respeitabilidade. Informou ainda que o diplomata italiano havia dissipado o dato da mulher; depois da morte dela, exigiu todas as jóias da falecida, que vendeu e, da mesma forma, dissipou tudo que apurou. E mais, apesar de ter ganhado muito dinheiro por ocasião deste casamento, o diplomata estava atolado em dívidas. Manifestando seu desejo de retirar-se para a Europa, reclamou sua filha. Obviamente, os avós queriam a tutela da neta, desejando dar-lhe uma brilhante educação, e, alegaram ainda, que temia pela saúde da menina, que sofria de contínuos ataques dos nervos. Temia, portanto, pela existência de sua neta.

Os pareceres dos advogados italianos apresentaram todos os itens desfavoráveis ao comendador Breves, sendo o mais importante o efeito do privilégio de extraterritorialidade o diplomata italiano podia ser dispensado de recorrer aos tribunais do país estrangeiro onde residia para reclamar judicialmente a tutela de sua filha. Informaram, ainda, que, pelo direito italiano, e no caso de Breves intentasse litigar nos tribunais italianos pela tutela de sua neta, e mesmo provando a dissipação dos bens herdados e do dote, advertiam ao avô de que, em matéria de direito de família, os tribunais não tinham tradição de interferir em questões de família. Aconselharam, portanto, a Joaquim José de Souza Breves a entrar em acordo com o genro. Ao que tudo indica, pela observação da correspondência diplomática, que o acordo acabou sendo feito, e o diplomata italiano acabou conseguindo outros ganhos de seu sogro. Sem dúvida, seu casamento foi um grande negócio para si.

[...] Deduzimos que o pleito de tutela da neta feita pelo comendador Breves, filha de diplomata italiano, foi resolvido através de um acordo entre as partes. [...] concluímos que, ao contrário de pensarmos na precariedade ou ausência de justiça para os estrangeiros residentes no Brasil em meados do século XIX, devemos considerar que estes dispunham de dispositivos de pressão política, através de suas representações diplomáticas que pressionavam pelos seus direitos.

NEDER, Gizlene. Herança, tutela e questões diplomáticas no Segundo Reinado (1840-1889). 2008 - História, Poder e Sociedade.SBPH - Sociedade Brasileira de Pesquisa Histórica.
<http://sbph.org/2008/historia-poder-e-sociedade/gizlene-neder>

   
 
       
     
 

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