Foi o que aconteceu com a comunidade de São João Marcos,
destruída de 1941 a 1945 pela empresa The Rio de Janeiro
Tramway, Light and Power, Co. Ltd., para dar lugar a um
projeto hidrelétrico. Os habitantes da cidade foram
forçados a deixar suas casas e mudarem-se para outros
locais, perdendo suas casas e afastando-se de parentes e
amigos. A saída da cidade foi, para grande parte das
pessoas, a negativa de seus sonhos plantados naquele
espaço social. Devido a esses fatores esse processo
aconteceu, para a comunidade de São João Marcos, na
contramão da utopia. A idealização da vida deixava de ser
o futuro e se transferia para o passado. (Dilma Andrade)
Com
a queda da mineração em Minas Gerais, já no final do
século XVIII, houve um crescente incentivo à produção de
gêneros agrícolas para exportação, tais como o açúcar
(principalmente), arroz, anil, fibras vegetais e também a
criação do bicho da seda. Com a transferência da corte
portuguesa para o Brasil, em 1808, essa tendência
acentuou-se, devido às medidas liberalizantes para o
comércio interno e externo. A necessidade de abastecimento
da corte também forçou o aumento da produção de gêneros
alimentícios. Em Rio Claro e São João Marcos há o
predomínio desses cultivos. Segundo José Pizarro e Araújo,
havia nas terras marcossensses por volta de 1808: 6
engenhos de açúcar e 4 de aguardente; os colonos
cultivavam cana-de-açúcar, mandioca, milho, arroz, legumes
e café. O açúcar era levado em sacos ao porto de Angra dos
Reis, sendo depois encaixotado e transportado ao porto da
Capital. Havia também a criação de porcos; parte da carne
ficava em conservas para consumo doméstico e a outra parte
era comercializada. Havia em toda a extensão de São João
Marcos 4.600 habitantes em 550 fogos (residências). (Dilma
Andrade)
As demolições começaram numa
Quinta-Feira Santa. A população protestou, saindo pelas
ruas com cartazes que diziam: "somos 4.600 brasileiros e
não queremos desaparecer". De nada adiantou, as turmas de
operários com marretas se sucederam, os prédios próximos
da represa foram demolidos por barcos rebocadores com
cabos de aço e o restante dos quarteirões foi reduzido a
pedregulhos pela dinamite.
O caso mais traumático foi o da Igreja Matriz. Sua
construção datava de 1796, com arquitetura maneirista,
típica dos jesuítas, e barroca; seu interior era todo
decorado em ouro. Os operários se recusaram a mexer com o
prédio sagrado e a construção era tão sólida que os
recursos "normais" de demolição não seriam suficientes.
Planta de São João Marcos
e arredores - |
Departamento de Patrimônio
da Light, 1913. |
(http://www.serqueira.com.br) |
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A Light, então, contratou um
especialista, sr. Dudu, de Rio Claro, para dinamitá-la.
Consta que, por coincidência ou maldição, o dinamitador
logo depois do serviço ficou "corcunda" e perdeu tudo,
terminando seus dias como jardineiro no colégio de freiras
de Valença, RJ.
Como a questão da derrubada da
Matriz despertou o clamor público e a indignação dos
católicos, o governo baixou um decreto (3 de junho de
1940) que obrigava a Light a reconstruir o templo em local
próximo e a salvo das águas.
Acalmados os ânimos, três anos
mais tarde, a empresa se veria livre da obrigação por novo
decreto (nº 5.739) que substituiu a reconstrução da Matriz
por uma simples indenização de 600 contos de réis ao
Estado.Apenas o cemitério foi respeitado e parcialmente
transferido para o alto de um morro. São João Marcos
finalmente estava extinta, em ruínas. Era hora de levá-la
para o fundo das águas. |